A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 estabeleceu que, mediante lei complementar, a União poderia instituir quaisquer impostos, desde que não-cumulativos, e que tenham fato gerador ou base de cálculos próprios. Não obstante, o legislador constituinte elencou especificamente sete impostos que competem à União instituir, exclusivamente, no artigo 153. Após 28 anos da promulgação constitucional, o único desses impostos que não foi regulamentado é o imposto sobre grandes fortunas.
O que é imposto?
Imposto é espécie do gênero tributo. Na definição legal, o artigo 3º, do Código Tributário Nacional, dispõe que imposto é toda prestação pecuniária compulsória instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa vinculada, que não constitua sanção de ato ilícito. Portanto, o imposto é uma prestação pecuniária que incide sobre fatos descritos na legislação em razão da atuação do contribuinte.
O imposto de renda da pessoa física, que consta no referido artigo 153, incide sobre rendimentos e ganhos de capital. É compulsório, ou seja, obrigatório. Diferentemente da taxa, ao recolher o imposto não há qualquer contraprestação do Estado em favor do contribuinte. O imposto também não se confunde com a multa, ao passo que não constitui uma sanção de ato ilícito.
A proposta de lei complementar para a regulamentação do imposto sobre grandes fortunas
Há seis anos, e sem previsão de desfecho, tramita o Projeto de Lei do Senado nº 534, de 2011. Conforme a redação do projeto, o patrimônio superior a 2,5 milhões de reais será tributável. O fato gerador do imposto é a propriedade de bens, até mesmo no exterior, de brasileiros, assim como o espólio e bens no Brasil de estrangeiros aqui domiciliados.
O patrimônio de até 2,5 milhões estaria então na faixa de isenção. A partir daí, haveria uma alíquota de 0,5%, até 5 milhões, e, assim, progressivamente, até a alíquota máxima de 2,5%:
Patrimônio | Alíquota |
Até 2,5 milhões | Isento |
Acima de 2,5 até 5 milhões | 0,5% |
Acima de 5 até 10 milhões | 1% |
Acima de 10 até 20 milhões | 1,5% |
Acima de 20 até 40 milhões | 2% |
Acima de 40 milhões | 2,5% |
Na hipótese de contribuintes casados no regime da comunhão universal de bens, estarão isentos até o total de 5 milhões. Nesse exemplo, o patrimônio dos filhos menores será tributado em conjunto com o patrimônio dos pais.
Além disso, alguns bens estarão igualmente isentos, como o imóvel de residência de até um milhão de reais. E o pagamento de outros impostos poderão ser também compensados no pagamento do imposto sobre grandes fortunas.
Na justificativa do PLS 534/2011, que aumentará a carga tributária das camadas mais ricas, o autor do projeto, Senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), menciona que “o sistema tributário é o instrumento primordial da redistribuição de riquezas”.
Contudo, o valor da primeira faixa de tributação não corresponde exatamente a “grandes fortunas”. Mais de 2,5 milhões não equivale, atualmente, nem sequer a 1 milhão de dólares, um parâmetro comumente adotado. A propósito, em 2016, havia no Brasil 172 mil milionários (3,35 milhões de reais), número que subiu apesar da crise.
O paraíso tributário para super-ricos
O Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo – IPC-IG, vinculado ao Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, concluiu, em artigo publicado em dezembro de 2015, que o Brasil é o paraíso tributário para super-ricos.
Os dados do estudo não convergem com as faixas de tributação estipuladas no projeto de lei complementar, já defasadas. Para o IPC-IG, os super-ricos correspondem a 71 mil pessoas no Brasil (0,05% da população adulta), cuja renda média em 2013 foi de 1,5 milhões de dólares.
Entre os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE, a Estônia é o único que não instituiu o imposto sobre grandes fortunas, assim como o Brasil. A OCDE é uma organização internacional que reúne países desenvolvidos, democráticos e com economias de livre mercado. Na América do Sul, somente o Chile é membro.
Ainda de acordo com o artigo, o Brasil possui uma carga tributária compatível com os padrões dos membros da OCDE. Não obstante, os tributos oneram mais a renda dos mais pobres. Os autores apontam que “nenhuma reforma de fôlego com o objetivo de ampliar a progressividade do sistema tributário foi realizada nos últimos 30 anos de democracia”.
Portanto, sem uma reforma profunda, dificilmente o sistema tributário brasileiro será equitativo, mesmo regulamentando o imposto sobre grandes fortunas.