Todos que conhecem o mercado de ações já ouviram histórias de quem, sem grande conhecimento e sem informação privilegiada, obteve ganhos súbitos com a compra e venda de ações, em razão da sorte, ou seja, em decorrência, por exemplo, de fatos imprevisíveis que causaram uma imensa valorização das ações de determinada companhia.
Pululam histórias também, até no noticiário especializado, de investidores imbuídos de intrincadas habilidades que se enriqueceram no mercado de ações. E dispendiosos cursos são geralmente atrelados a essas histórias.
Sabe-se então que é possível obter ganhos no mercado de ações tanto com a sorte quanto com a habilidade.
Mas a sorte vale mais do que a estratégia? Ou a estratégia vale mais do que a sorte?
Sorte e estratégia são dois conceitos presentes tanto no mercado de ações quanto na teoria dos jogos, que é, aliás, largamente aplicada para explicar as relações econômicas.
Para compreender a relação entre sorte e habilidade, o mercado de ações será a seguir comparado a dois diferentes jogos.
Mercado de ações
As ações são unidades que representam o capital social das companhias, igualmente conhecidas como sociedades anônimas.
O capital social equivale ao total de contribuições em dinheiro ou bens da sociedade anônima. O valor é fixado no estatuto, que é periodicamente corrigido.
Para exemplificar, o Estatuto Social do Banco do Brasil S.A., modificado pela Assembleia Geral de 27.04.2017, fixou que o capital social da companhia é de R$ 67 bilhões, dividido em 2.865.417.020 (dois bilhões oitocentos e sessenta e cinco milhões quatrocentos e dezessete mil e vinte) ações ordinárias.
O Banco do Brasil tem apenas ações ordinárias. Portanto, teoricamente, ao dividir o capital social pelo número de ações, cada ação do Banco do Brasil equivaleria a R$ 23,38. Porém as ações das companhias abertas são negociadas a preços livres no mercado, de acordo especialmente com a lei da oferta e da procura.
No fechamento do último pregão de 2017, as ações do Banco do Brasil – BBAS3 foram negociadas acima do valor do patrimônio, a R$ 31,82.
Há dezenas de empresas listadas na B3, que atuam nos mais diversos segmentos da economia. Saiba mais sobre essas companhias listadas na bolsa, clique aqui.
Como o acionista lucra com as ações? Em resumo, o acionista, detentor de ações, tem direito a receber dividendos, independentemente da natureza das ações que possui. O acionista pode ainda emprestar ações, mediante recebimento de aluguéis, bem como negociá-las de muitas maneiras no mercado de ações.
Jogos e ações
Em geral, no movimento dos jogadores do tabuleiro, bem como dos investidores no mercado, há sempre uma dose de técnica e uma de aleatoriedade que determinarão o sucesso ou o fracasso.
Muito embora o mercado de ações não seja um jogo de soma zero, ao contrário especificamente dos jogos de tabuleiro, isto é, a vitória de um dos jogadores não depende necessariamente da derrocada dos demais, há no mercado – além dos jogadores, é claro – regras e movimentos típicos dos jogos de tabuleiros.
Mais sorte do que estratégia
Banco Imobiliário, ou Monopoly, é um jogo que retrata o mercado imobiliário. Nesse jogo a sorte é mais importante do que a estratégia.
Inicialmente, todos os jogadores recebem a mesma quantidade de capital.
O movimento de cada jogador é realizado pelo lançamento dos dados e distribuição de cartas. O vencedor se destaca por acumular, aos poucos, como uma bola de neve, investimentos mais rentáveis. Até que, em determinado ponto, um dos jogadores vence com a decretação da falência de todos os seus oponentes.
A habilidade se limita a pouquíssimas ações, como a decisão de construir casas e hotéis nas propriedades.
Assim, em Banco Imobiliário, famoso jogo de tabuleiro, a estratégia definitivamente ocupa o segundo plano.
Logo, se o mercado de ações for equiparado ao Banco Imobiliário, comprar ativos é sempre uma boa ideia.
Mais estratégia do que sorte
Diferentemente do Banco Imobiliário, War é um jogo que simula conflitos bélicos e diplomáticos.
War é conhecido também como Risk, e a estratégia está em primeiro plano.
Cada jogador possui um objetivo para vencer o jogo, conquistar determinados continentes, certo número de territórios ou destruir um jogador. O jogador conhece, todavia, apenas o próprio objetivo. No início, são também divididos em números iguais os territórios entre os participantes, que devem preenchê-los com pelo menos um exército.
A cada rodada, os jogadores adquirem novas tropas, além de travarem batalhas entre eles para o cumprimento dos respectivos objetivos. Se um dos jogadores demonstrar claramente qual é o seu objetivo, os outros provavelmente o sabotarão, a fim de que evitem a derrota.
Jogadores experientes de War costumam traçar estratégias para evitar que os demais vençam e para não despertar a atenção dos oponentes.
Não obstante o peso da habilidade, a sorte é indispensável para alcançar o objetivo. Seja para vencer batalhas, com o lançamento dos dados, seja para ocupar, no começo, uma posição territorial mais privilegiada. Mas o jogador que conta só com a sorte, muito provavelmente sucumbirá.
Ao comparar o mercado acionário ao War, conclui-se que o investidor deve buscar ativos que o levarão ao seu objetivo.
A sorte é mais relevante do que a estratégia no curto prazo, mas…
O jogo War parece simular um ambiente mais semelhante ao mercado de ações do que o Banco Imobiliário. Adquirir ativos que o levarão a conquistar seu objetivo parece ser mais racional do que adquirir todos que puder.
E em War, assim como no mercado de ações, a sorte é mais importante no início.
Um jogador de War sem estratégias dificilmente vencerá ao final. E isso se aplica do mesmo modo ao mercado de ações.
O exemplo do investidor sortudo se resume a uma, ou, senão, a pouquíssimas movimentações positivas no mercado. Ao passo que o investidor com habilidade acumula mais sucessos do que fracassos ao longo da caminhada financeira.
Para Aswath Damodaran, professor de finanças da Universidade de Nova Iorque, o mercado de ações vai recompensar no curto prazo quase sempre quem conta mais com a sorte, e não quem está mais preparado.
Uma das lições de Damodaran, ensinada no livro Mitos de Investimentos (Financial Times-Prentice Hall, 2006), parece, à primeira vista, desestimulante.
Contudo, no longo prazo, a situação é diferente. Em dez anos, é improvável que o investidor que contou somente com a sorte terá colhido bons frutos.